Uma bola de fogo brilhante capturada sobre o Atacama Large Millimeter / submillimeter Array (ALMA) localizada no planalto de Chajnantor nos Andes chilenos. ESO/C. Malin

Observadores ouvem meteoros super brilhantes ao mesmo tempo em que os veem?

Estudo recente aponta teoria capaz de explicar motivos pelos quais observadores ouvem meteoros super brilhantes ao mesmo tempo em que os veem.

Uma bola de fogo brilhante capturada sobre o Atacama Large Millimeter / submillimeter Array (ALMA) localizada no planalto de Chajnantor nos Andes chilenos. ESO/C. Malin

Está com os cabelos arrepiados hoje? Pelo menos isso pode te dar um “super poder” temporário: ouvir meteoros. A literatura astronômica contém relatos de observadores que escutaram meteoros brilhantes que, ao realizar uma passagem, fizeram sons de chiados, estouros ou estalos.  Recentemente, um estudo publicado na Nature: Scientific Reports pela SNL (Sandia National Laboratories), sugere uma possível causa.

A maioria dos meteoros que enxergamos à noite são minúsculos grãos de poeira incandescentes que percorrem a alta atmosfera, atingindo a velocidade de até 70 quilômetros por segundo. Eventualmente, surge algo significativamente grande, ou seja, do tamanho de uma bola de golfe ou maior queimando como uma bola de fogo brilhante. Uma bola de fogo (fireball) é um meteoro mais brilhante que a magnitude -4 (tão brilhante quanto Vênus) e um bólido é um meteorito incandescente que deixa um rastro de luz.

Às vezes, os observadores relatam terem ouvido sons de chiados ou estalos seguidos da aparição de bolas de fogo brilhantes e simultaneamente, um brilho repentino. Tal fato ocorre devido à distância. Os meteoros se chocam contra a camada tênue da alta atmosfera (que não é uma boa propagadora de som). Tais meteoros caem em uma grande distância: na mesosfera, a cerca de 75 a 100 quilômetros acima da alta atmosfera. O som se propaga a 767 mph ao nível do mar. Basta imaginarmos relâmpagos em um dia ensolarado e como nós percebemos o brilho alguns segundos antes que o som do trovão chegue em nossos ouvidos.

Meteoro é observado atravessando a alta atmosfera, capturado na Estação Espacial Internacional. NASA.

Há ainda mais relatos de meteoros audíveis. O estudo do Sandia (Sandia National Laboratories) atesta que flashes fortes de milissegundos registrados em bolas de fogo brilhantes são intensos o bastante para induzir o aquecimento radioativo em materiais dielétricos, como folhas secas, roupas ou até os cabelos do observador, por meio de efeito fotoacústico.  As superfícies irradiadas aquecem o ar próximo aos materiais dielétricos, produzindo pequenas oscilações de pressão – em outras palavras, o som. O estudo demonstra que um bólido em torno de -12 em magnitude (quase tão brilhante quanto a Lua cheia) pode induzir um som audível (cerca de 25 decibéis) em um material dielétrico, alto o suficiente para ser ouvido. Para fins de comparação, um sussurro atinge de 10 a 20 decibéis no limiar inferior, (nível mínimo de intensidade necessário para que um som se torne audível a um indivíduo) ou seja, quase inaudível. O estudo sugere ainda que cabelos crespos podem ser transdutores mais eficientes do efeito fotoacústico.

“É notável que as pessoas com cabelos crespos sejam mais propensas a ouvir sons simultâneos de meteoros”, denota o estudo. “Intuitivamente, cabelos crespos são bons transdutores por duas razões: os cabelos próximos aos ouvidos criam pressão sonora localizada, portanto é provável que tenham sensibilidade ao som. Além disso, o cabelo crespo possui grande proporção em superfície e volume, o que maximiza a criação de som. O efeito fotoacústico é definido pela geração do som após a absorção da luz por um determinado material. O inventor Alexander Graham Bell observou pela primeira vez o efeito fotoacústico em 1880. Sua invenção, conhecida como fotofone, funcionou usando o efeito fotoacústico. É possível simular esse efeito estranho usando um par de lanternas para reproduzir o tema da Marcha Imperial de Star Wars: The Empire Strikes Back, por exemplo.

O estudo denota que flashes intensos de milissegundos foram observados em praticamente todos os bólidos brilhantes documentados pela Czech Fireball Network. Uma bola de fogo especialmente brilhante de magnitude 15, chamada EN091214, foi registrada pela rede no início da noite de 9 de dezembro de 2014. Uma análise cuidadosa na rápida mudança de intensidade mostrou que ocorreram combustões curtas na bola de fogo brilhante, dezenas de vezes por segundo. Várias testemunhas nas proximidades ouviram sons ao mesmo tempo em que ocorria tal fenômeno. Os cálculos do estudo apontam que a luz intensa e variável da bola de fogo deve ter produzido um nível sonoro de 27 ± 3 decibéis, conforme os relatos das testemunhas.

Uma bola de fogo brilhante capturada pela Czech Fireball Network em 13 de outubro de 1990. Rede Europeia de Bolas de Fogo / Wikimedia Creative Commons.

Efeito Fotoacústico versus som Eletrofônico

Ao longo dos anos, meteoros audíveis foram explicados simplesmente como sendo um fenômeno psicológico, ou talvez um efeito produzido localmente, criado por ondas de baixa frequência ou como um fenômeno conhecido como som eletrofônico. Edmond Halley coletou relatos de testemunhas oculares de uma bola de fogo brilhante vista sobre a Inglaterra na noite de 19 de março de 1718. Os espectadores alegaram que “foi como se houvesse um assobio contínuo, muito próximo”. Tal declaração foi rejeitada Halley.

O meteorologista Harvey Nininger relatou o fenômeno de meteoros audíveis em seu livro Out of the Sky, 1952. A indução de som eletrofônico de baixa frequência a partir de emissões de rádio VLF seria de 1 a 10 Hertz.  Há possibilidade dessas ondas produzirem som quando estão próximas a condutores como fios de telefone, árvores ou grama. Observando os meteoros Perseidas, um estudo liderado por uma equipe japonesa em 1988 confirmou a teoria. Contudo, essa teoria apresentou um problema: as bolas de fogo não geram muita energia nos comprimentos das ondas de rádio.

Certa vez “ouvimos” um assobio peculiar de uma Perseida brilhante, que chovia durante uma noite quente de verão ao norte de Maine. Os relatos, anedóticos com certeza, transmitem a sutileza do fenômeno sonoro. Durante a chuva de meteoros Leônidas em 1998 nos desertos do Kuwait, observou-se uma exibição meteorítica, na qual bolas de fogo brilhantes emergiam em poucos segundos, porém não houve propagação de efeito sonoro quando ocorreu o fenômeno.

Um mapa divulgado pela NASA em 2014 demonstra eventos de bólidos ocorridos em todo o mundo, ao longo de duas décadas. Os dados da pesquisa foram coletados pelos sensores do Departamento de Defesa dos EUA, para serem utilizados em testes nucleares ao redor do globo. Os pontos azuis indicam eventos noturnos, enquanto pontos alaranjados destacam os eventos diurnos.
NASA / Planetary Science / US DoD

Por que não há mais casos registrados ou relatos de grupos de pessoas que ouviram o mesmo fenômeno? Provavelmente, por que o som produzido pelo fenômeno é difícil de ser ouvido. É descrito como um som bem sutil, quase um sussurro. É relatado um som similar a estalos e assobios assim como nas auroras.

Tradução: Guilherme Augusto @g2gschool

Fonte: Sky and Telescope

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